sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Ácido Láctico - Mitos

O texto seguinte é um excerto do Livro “A Dieta Paleo para Atletas” 1 de Loren Cordain e Joe Friel. O livro foi publicado em 2005 pela Rodale Press.

1 A “Dieta Paleo” é uma abreviatura de dieta do paleolítico. Em termos muitos resumidos, existe uma corrente de opinião que defende que o nosso corpo está geneticamente preparado para comer o que se comia durante o período do paleolítico, onde éramos caçadores colectores. Algumas das doenças que nos afectam actualmente (ataques de coração, AVC, etc.) apareceram depois, durante o período neolítico, devido a alterações na alimentação. Na Internet é possível encontrar muita informação sobre o tema.

Durante quase um século, atletas e fisiologistas consideraram o ácido láctico como a principal fonte de fadiga durante exercícios de alta intensidade e consideravam-no um produto do metabolismo muscular para “deitar fora”. Mas actualmente, esta forma de pensar está a ser posta em causa. Recentemente os cientistas aprenderam que esta substancia que produzimos em grandes quantidades durante o exercício não é causa de fadiga, mas actualmente ajuda a prevenir a mesma.

Esta antiga forma de compreender o ácido láctico começou com o fisiologista e prémio Nobel Inglês Archibald V. Hill, o qual em 1929 no seu laboratório provou utilizando ratos que a fadiga muscular estava associada à acumulação de ácido láctico. O que ele não sabia, e o que apenas recentemente aprendemos, é que quando o músculo é visto como parte de um sistema biológico completo, ao invés de ser analisado isolado do resto do corpo, o ácido láctico é processado e convertido em energia para ajudar os músculos a continuar em funcionamento. Ele não causa fadiga.

Nem o Ácido Láctico causa as dores musculares no dia seguinte ao exercício. Isto é um mito que existe há décadas e que se recusa a desaparecer embora haja clara evidência do contrário nos últimos 20 anos. A causa mais provável dessas dores musculares é a inflamação de algumas fibras musculares devido a excesso de utilização.

Então se o ácido láctico não é o vilão que pensávamos que era, o que é que causa a fadiga e a sensação de calor nos músculos durante exercícios curtos e intensos como treino de séries ou competições que duram poucos minutos? Para obter uma resposta é necessário compreender a escala do pH, a qual nos diz quanto ácidos ou alcalinos (base) os fluidos do nosso corpo estão medidos numa escala de 1 a 14 associada ao aumento ou diminuição dos iões de hidrogénio. Nesta escala, valores abaixo de 7 (pH neutro) indicam um aumento da acidificação enquanto valores acima de 7 indicam um aumento da alcalinidade. Exemplo de fluidos ácidos são ácido hidrocloridico (pH=1) e vinagre (pH=3) enquanto o leite (pH=10,5) e a amónia (pH=11,7) são alcalinos.

Em repouso o pH do nosso sangue é por volta dos 7.4 – ligeiramente alcalino.
Em termos do sangue, pequenas alterações no equilíbrio ácido-base têm grandes consequências. Por exemplo, durante um esforço máximo de dois a três minutos, o pH do sangue pode baixar até 6.4. Em termos bioquímicos, isto significa uma enorme alteração da acidificação, que produz uma sensação de calor no músculo que produz o trabalho e conduz à inabilidade do mesmo continuar a contrair. A fadiga instala-se.

Se o ácido láctico não é a razão para a queda do pH, quem o será? A resposta reside nas nossas fontes de energia durante esses curtos esforços de alta intensidade – glicogénio e glucose. Ambos são hidratos de carbono, mas têm uma composição química ligeiramente diferente. O Glicogénio está armazenado dentro do músculo de onde pode ser rapidamente transformado em energia. A Glucose, que se encontra armazenada no fígado e na corrente sanguínea, é “recrutada” para a produção de energia quando as reservas de Glicogénio não conseguem satisfazer a procura ou quando esta começa a escassear. Quando o Glicogénio é transformado para produzir energia uma unidade de hidrogénio é libertada. Mas se a glucose também têm que ser utilizada na produção de energia, que é caso dos exercícios de alta intensidade, duas unidades de hidrogénio são libertadas. Esta rápida duplicação de iões de hidrogénio no sistema reduz o pH causando “o calor” e a fadiga associada à acidificação. A mesma quantidade de ácido láctico é produzida independentemente da fonte de energia utilizada.

Longe de ser um vilão, o ácido láctico é um aliado durante exercícios intensos. Ele contribui para manter o corpo a “trabalhar” quando a intensidade aumenta. Além de ser reconvertido em fonte de energia, quando o hidrogénio se começa a acumular, o ácido láctico transporta-o para fora da célula muscular e ajuda a atenuar os seus efeitos negativos.

Após, aproximadamente 80 anos, a má reputação do ácido láctico está a ser alterada.

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